sexta-feira, novembro 08, 2013

Sombras



É noite. Avanço pela floresta sombria. Há minha volta a escuridão é pontuada por olhos brilhantes que me observam e seguem cada passo que dou. 
Não há um só raio de luar. O medo começa lentamente a apossar-se dos meus sentidos que se tornam aguçados - atenta a cada som, a cada movimento. Num impulso, retrocedo um pouco, viro-me e quero correr, voltar de onde vim, onde havia calor, luz, conforto. Mas o caminho já não existe. É apenas um negrume sem forma onde posso vislumbrar pontos brilhantes que se aproximam, esperando apenas o momento certo.
 Sigo em frente, apavorada. Os sentidos começam a errar e só me apetece correr. O terror aumenta, transforma-se lentamente em pânico. Sinto-me indefesa. Tão pequena, tão minúscula, que qualquer gesto, qualquer palavra me poderá esmagar.

A palavra é proferida.

Então num movimento fugaz, uma dor dilacerante invade-me, consome-me.
Uma tristeza tão grande e tão profunda devasta-me os sentidos.
Um lamento perde-se no ar levando consigo o meu último folego.
Então tudo torna-se maleável, eternamente lento e baço. O tempo pára, tudo pára.
Já não sinto dor, já não sinto seja o que for.
A escuridão desce sobre mim e fico a pairar nas sombras esquecidas…
Vagueio pela floresta sombria, há minha volta só há escuridão.
 



Ao longe um brilho avança, quente, reconfortante. No mesmo instante sinto-me atraída para aquela luz viva, o desejo de a ter, de a sentir, atrai também outras sombras.
Numa dança improvisada rodeamo-la, a luz começa a tremeluzir, alternado entre o fulgor brilhante e a chispa amedrontada. O cerco aperta-se à sua volta, rosno às outras sombras – Quero-a só para mim! Então salto, agarro-a e rasgo o involucro que a contém – É minha! Só minha! – rejubilo, sinto o seu calor, consumo-a… 
Sinto-me viva, vibrante e no instante seguinte o seu brilho cessa, esfuma-se e no seu lugar surge mais uma sombra.

quinta-feira, novembro 07, 2013

Encantos 1

A cidade, ao domingo, parece adormecida.

Quase ninguém sai à rua. As poucas pessoas que se aventuraram a quebrar o encanto da cidade, passeiam-se lentamente debaixo da chuva miúda que cai.

Eu junto-me a esses estranhos seres. Caminho perdida na eterna magia do amanhecer.
Embalada pelo chilrear dos pássaros caminho despreocupadamente. A brisa límpida expande o meu pensamento, levando-me para um lugar encantado.
Certamente conhecem a lenda!... Já devem ter ouvido falar do feiticeiro que mergulhou a antiga cidadela numa nuvem de dormência!? E apenas em certas manhãs, quando o ar é leve e fresco, quando o sol e a chuva se beijam é possível descobrir-la. Em certos momentos é possível vislumbrar o sereno ritmo da antiga cidadela. É possível ouvir os sorrisos tímidos mas alegres dos seus habitantes e o encanto da natureza que a rodeia.

terça-feira, agosto 13, 2013

La Mort

A mensagem chegou-me de forma inesperada.
Um estranho aproximou-se e disse-o, com uma voz fria e sem qualquer sentimento, «Sophia morreu!», desaparecendo em seguida nas sombras do fim da tarde. 
Perguntei em voz alta o que acontecera, com um misto de incredulidade e temor. Talvez já fosse longe para me ouvir, pensei. Mas das sombras uma voz me respondeu - «Morreu! ... Sophia morreu. Morreu engasgada!»
As sombras foram crescendo e invadindo o parque e a noite instalou-se aos poucos.
Caminhei pensativa, tentando perceber o que acabara de acontecer. Sem saber como, dei por mim à porta de sua casa. A porta estava entreaberta e uma pequena faixa de luz iluminava o passeio.
Entrei.
A casa, antes alegre, quente e luminosa, era agora um lugar frio e arrepiante. A tristeza percorria as suas paredes e uma ligeira saudade pesou-me no peito.
Caminhei pelo corredor até à pequena sala de onde a luz provinha. Ninguém! Nada se movia, e o silêncio pesava. No centro da sala um caixão negro - 'pequeno de mais', pensei - com rosas negra a adornarem-no...
O momento foi quebrado pelo som de passos. Entraram quatro homens e levaram a tumba.
Uma rosa caiu aos meus pés. E senti um grande pesar. 'Sophia morreu, Sophia morreu' era tudo o que conseguia ouvir dentro da minha cabeça. Agoniada saí daquela casa moribunda e vagueie perdida pelas ruas.
Pela madrugada segui até ao cemitério. Seria o último momento, a última homenagem a Sophia.
Ao chegar reparei uma vez mais no vazio, no silêncio, na ausência de todos - familiares e amigos. As únicas companheiras de Sophia para a eternidade seriam as inesquecíveis rosas negras.
O caixão desceu, no meu coração senti um pequeno aperto, saudade e tristeza, mas nem uma lágrima derramei.